sábado, 26 de março de 2011

As caixas de Pandora

Pandora, John W. Waterhouse (1896)

"Ora, tinha Epimeteu em seu poder uma caixa que lhe haviam dado os deuses, que continha todos os males. Avisou a mulher que não a abrisse. Pandora não resistiu à curiosidade. Abriu-a e os males escaparam. Por mais depressa que providenciasse fechá-la, somente conservou um único bem, a esperança. E dali em diante, foram os homens afligidos por todos os males."



A lenda de Pandora, a princípio, não parece possuir um conteúdo moralista, como diversas outras lendas passadas de geração em geração. E não tem razão de ser, é apenas uma explicação do motivo das coisas, na interpretação grega. Porém quantas caixas de Pandora já não foram abertas? É apenas uma prova que o homem está distante da perfeição, que o impulso de vida é o mesmo que deflagra o verdadeiro holocausto, como posso lembrar nesses conhecidos casos:



-Chernobil: assunto que voltou na mídia nos últimos tempos.  Esse só não é um exemplo clássico, pois é extensa a lista de acidentes envolvendo radiação, e todos eles estão ligados a erros técnicos, provando que, da mesma forma que a inteligência humana cria novas possibilidades, as ambições criam responsabilidades;


Peste Bubônica - Bruegel.
-Peste Negra: não parece certo colocar essa, a maior epidemia já registrada, como obra do homem. As condições da época proporcionaram sua propagação, e assim como qualquer outra epidemia, é praticamente impossível identificar seu causador. A caixa de Pandora, nesse caso, está na cultura da época. Quantos judeus foram perseguidos, trucidados, culpados por Deus terem os castigados com essa doença? Por vezes, não é só a inteligência humana que o torna vítima de si próprio;



-Titanic: uma empreitada que através do oceano tentou atender a cobiça da burguesia e, menos notado, os sonhos de marginalizados. Mais do que um exemplo da imperfeção humana, este nos mostra que peca aquele que acredita que a vida só existe para os afortunados e esquece que estamos ligados a nossa condição biológica;


-Aquecimento global: essa é uma caixa de pandora que aos poucos vai sendo aberta, pelas “mãos” de milhares de macacos sábios;

Estátuas de templo japonês do século XVII



Astra Castra - Hatton Turner (1865).
-Mar de Aral: sua desertificação, apesar de justificado frente a necessidades de uma população em situação de pós-guerra, prova o quanto é inconsequente um governo ditador que apenas propõe vigia ao sustento de sua imagem de império. É como se o titã Atlas fosse rebaixado a uma formiga trabalhadora;


-Triangle Shirtwaist: o nome refere-se a fábrica consumida pelo fogo, em 1911. O caso chama a atenção não só pelo fato das péssimas condições que estavam submetidos, até então, a mão-de-obra industrial. Melhor dizendo, essa é uma caixa de Pandora às avessas: um indivíduo que, com o advento da revolução industrial, sempre foi considerado um reles objeto para produção de dinheiro, passou a ser valorizado e amparado na medida em que, os próprios indivíduos dessa classe, mobilizaram-se e começaram e lutar por isso. Ainda assim, outros casos continuaram ocorrendo, como exemplo um ocorrido em São Paulo, o incêndio no Edifício Joelma, em 1971;


-Segregação de Montgomery: com o mesmo espírito do caso anterior, esse é um exemplo de como o coletivo possui força suficiente no confronto às minorias. Desse incidente destaca-se Martin Luther King Jr., conhecido pela luta dos direitos dos negros;


-Guerras Mundiais: não posso deixar de comentar esses eventos mundiais. Apesar de claras as consequências, apesar das justificativas políticas dentre as quais grande parte demagógicas, é notável como o sentimento de esperança é intensificado, é notável como os males do mundo têm sido superados ou abrandados. 


Apesar de tudo, Pandora tomou a decisão certa antes que as trevas dominassem o mundo. Quem sabe ela não esteja entre as traições, entre os golpes, entre todos os sentimentos egoístas, porém de mãos dadas com o ingênuo, porém zeloso Epimeteu?

sexta-feira, 11 de março de 2011

Velhos-Novos tempos do Fundamentalismo Religioso

A história de milênios e milênios é absoluta quanto ao objeto principal da existência das sociedades: a religião. Ela sempre foi uma arma poderosa de dominação, ainda que isso sempre tenha parecido pequeno frente ao principal objetivo dos que recorrem a igrejas, congregações, templos, mesquitas, etc – o chamamento ou prestação ao divino.

Particularmente não gosto de discutir sobre esse tema, tenho minha convicção formada e, no mais, existe a convicção fruto da cultura geral e, em proporção menor, a individual (ainda que esse conceito seja resumido a Adão e Eva, morte e ressureição de Jesus, os Dez Mandamentos, e daí afora), é como se Golias fosse reduzido a um átomo. Sempre tive por princípio não fazer parte de um time sem saber suas reais intenções, pois adoto a premissa de Nietzsche: Não posso acreditar num Deus que quer ser louvado o tempo todo.

Fundamentalismo religioso nada mais é que utilizar interpretações bíblicas avulsas e usá-las como ferramenta de, na maioria das vezes, dominação. O vídeo abaixo mostra uma espécie de seita conduzida por um pastor evangélico. Esse é um exemplo de uma verdadeira alienação com fins muito questionáveis (fundada nos dogmas dessa seita e pregando tais preceitos com violência), sendo esses o desrespeito com outras religiões (8:57 e o segundo video), a intolerância com as distintas composições sociais (1:07), e algo que me surpreendeu, a hostilidade frente a nossa Constituição (5:00) (11:06). Em outro vídeo desse mesmo canal pode ser visto o “pastor” com uma camiseta que possui a frase "Bíblia sim, constituição não".



Quanto à atitude do pastor, vejo muita hipocrisia (pois diz ser vítima de perseguição por estar apenas exercendo seu direito de liberdade de expressão e de liberdade religiosa - Curioso que esses dois direitos são garantidos pela constituição que ele não aceita) e uma ignorância fracamente justificada.

Eu questiono que benefícios isso traz a sociedade, onde está o espírito de amar ou, no mínimo, respeitar seus semelhantes, o que as atitudes extremadas que os seguidores podem tomar representa diante de Deus? Vejo apenas pessoas sendo treinadas a serem nocivas, a perder o domínio do dom da inteligência, e padecerem no conformismo frente ao que Deus reservou em suas vidas.

Isso vale pra demais “seitas”. Respeito demais líderes religiosos que, muitas vezes, utilizam-se do ponto fraco dos pobres para fazer furtuna (pois isso é, infelizmente, comercial e lucrativo), apenas tenho pena da mentalidade que tem nosso povo, mas muito não pode ser feito numa questão que vêm sem solução há séculos. Também não posso negar que há líderes de bem, como já pude presenciar.

Quanto aos seguidores, acredito que não é necessário o "Tratamento Ludovico", e uma batalha para libertá-los seria idêntica à eterna batalha entre a ciência e a religião.

Cada um tem sua verdade sobre o mundo, mas é de bom senso que não ultrapasse a barreira do respeito.

domingo, 6 de março de 2011

Versos, problema e lenda


Narrativa indiana
 
São essas três inscrições encontradas na cela de um homem hindu, no meio de figuras disparatadas, palavras sem sentidos, dentro de uma organização incompreensível:

I - Versos de consolo aos aflitos

“A felicidade é difícil porque somos muito difíceis em matéria de felicidade. Não fales da tua felicidade a alguém menos feliz do que tu. Quando não se tem o que se ama é preciso amar o que se tem.”


II - Um problema existe apenas quando dele se é leigo

É possível colocar 10 soldados em 5 filas, sendo que cada fila deve ser composta por 4 soldados? Sim, como inscrito pelo prisioneiro, desde que cada soldado figure em duas filas, como pode ser visto na figura abaixo:



III - Advertência ao poderoso


Confúcio quando questionado quantas vezes deve um juiz pensar antes de sentenciar: somente uma vez hoje, porém dez vezes amanhã. A primeira será suficiente, quando o juiz, após exame, decidir pelo perdão. A segunda, porém, deverá o magistrado pensar, sempre que se sentir enviesado a lavrar sentença condenatória.

IV - Conclusão

Se existe uma relação entre tais inscrições - ainda que dado outro sentido quando escrito pelo prisioneiro hindu – podemos reduzi-las nas palavras do mesmo mestre Confúcio:

“Erra, por certo, gravemente aquele que hesita em perdoar; erra, entretanto, muito mais ainda aos olhos de Deus, aquele que condena sem hesitar.”