domingo, 20 de novembro de 2011

A Eutanásia, Hoje

A questão da eutanásia, dentro dos princípios que definem as bases de uma sociedade, está quase que totalmente ligada aos seus ditames éticos e morais. A história milenar comprova isso, a diferença é que outrora sua prática estava ligada, principalmente, à cultura religiosa. Quando não, a eutanásia estava ligada da forma como o Estado cuidaria dos governados, no tocante ao controle populacional, na política de defesa nacional, entre outros aspectos onde o ser humano pudesse ser visto como, em algum momento, desnecessário.
Os diversos pensadores que discorreram sobre esse assunto possuíam justificativas distintas. Quanto aos que defendiam a prática da eutanásia, essa prática era considerada como forma de proteção da sociedade. Enquanto os que eram contra, assim como hoje, consideravam o aspecto humano da prática.
Ainda que se considere as opiniões de terceiros, não se pode olvidar a autonomia da vontade, melhor dizendo, quando a vontade da prática vem de pessoas conscientes, sem interesse algum se não o aliviamento da dor do ente, quando não o próprio.
Nações antigas possuem em seu histórico situações da prática da eutanásia, prevendo-a até em suas legislações. Exemplos como os expedientes da Alemanha, Rússia, Suíça, Tchecoslováquia e até do Peru, mostram que, ao contrário do nosso país, a questão do direito inviolável a vida pode possuir exceções.
A falta de um consenso sobre a eutanásia é justificada por questões médicas: "o cenário da morte e do morrer cria-se, não só para os pacientes incuráveis e terminais, como também para os próprios médicos" -op cit. Ainda que a morte seja uma certeza, não é possível prevê-la com precisão, nem se furtar a certezas ligadas a inviabilidade da vida em virtude do coma, do estado vegetativo, assim como de doenças incuráveis ou terminais. Essa mesma medicina é responsável pela elevação da expectativa de vida da população, o que põe a eutanásia no caminho contrário da prevenção e prolongamento da vida de um indivíduo.
A eutanásia também encontra uma barreira ao considerarmos o modelo cristão que orienta as relações em sociedade, segundo o qual  “não é a justiça humana, nem a justiça que o homem deve praticar e sim a justiça divina imputada pela graça de Deus ao homem que crê na sua palavra”. A religião, de forma genérica, considera que o homem, um ser imperfeito e longe da sabedoria plena, está longe de ter o direito de acabar com aquilo que apenas o Criador deve cuidar.
Aqui no Brasil, a prática da eutanásia não está elencada de forma expressa, encontrando sua melhor tipificação no art. 121 do Código Penal, ou seja, homicídio, simples ou qualificado, sendo considerado crime a sua prática em qualquer hipótese. Dependendo as circunstâncias, a conduta do agente pode configurar o crime de participação em suicídio, de acordo com o art. 122 deste mesmo diploma.
O Anteprojeto que está em estudo no nosso país, tenta ser um meio termo entre a prática da eutanásia e o crime que se constitui quando se tira a vida de alguém. Ele se liga a aspectos atenuantes da prisão, o que pode ser visto tanto como uma evolução, quanto uma maneira tímida de acompanhar as aspirações mundiais.
Esse mesmo diploma prevê a ortotanásia, constituindo-se da omissão médica perante a evolução de uma doença que acomete um indivíduo, onde seria ela autorizada após atestada pelo médico a impossibilidade da cura, assim como a morte iminente e inevitável. A omissão de alguém sem as prerrogativas médicas, obviamente, não se encaixaria no perfil previsto.
 

A essência da ortotanásia não está ligada ao sentimento humano, mas à fins práticos, dentro do contexto de política pública já abordado. Importante destacar que, em outras épocas, a eutanásia fora utilizada como forma de seleção, sendo que em algumas civilizações os recém-nascidos de pronto eram examinados objetivando a detecção de imperfeições.
Se há um ponto comum dentro desse tema, este seria que o direito a vida está presente em qualquer sociedade moderna. E daí surgem as nuances conceituais de ética, moral, religião, etc. A forma como se organiza a vida é a base da sociedade. A eutanásia, ainda que aparentemente se encaixe nesse aspecto, poderia estar desvalorizando e até incentivando a relatividade da vida, onde terceiros estariam colocando à margem aqueles que merecem ou não viver.
A eutanásia realmente não se encaixa em qualquer conjunto de princípios, e é por isso que o tema está muito longe de um fim. Ainda que essa nova missiva legislativa, assim como nosso sistema, de toda forma, concentre-se mais nos aspectos legais, faltam justificativas suficientes, e se presume que elas nunca terão razão de existir, pois uma sociedade que não busca preservar a vida dos seus membros pode estar fadada a fragmentar-se e fenecer-se.